terça-feira, 16 de outubro de 2012

Orgulho e Humildade


Olho para vós, …e vejo pequenos agreiros nos vossos olhos. Olho para mim e vejo que tenho uma trave nos meus.

Serve-me este intróito, à luz do que consta no evangelho de Mateus, para uma simples reflexão sobre um aspecto simples e simultaneamente complicado para o ser humano: A noção da consciência.
É fundamental estar ciente do nosso estado de consciência, para um maior entendimento sobre o que retarda ou adianta a nossa evolução espiritual. Pois a consciência é a noção das realidades internas e externas ao nosso ser.

É o estado objectivo de consciência que nos diferencia uns dos outros. De todos os seres vivos no planeta. Poderei estar errado, mas penso que só o Homem é dotado de consciência, ainda que este nem sempre a ouça convenientemente.
Esta mesma consciência que nos permite diferenciar o bem do mal, em todo o espectro da nossa vivência comum.

Já Sócrates e Platão referiam que o homem deveria de viver e agir de acordo com a sua consciência, num contexto abrangente às leis que nos regem, sejam Físicas, Legais, Naturais ou Morais.

E é sobre um aspecto dentro da Lei Moral que desejo falar-vos. 

“O orgulho vos induz a julgardes mais do que sois, a não aceitar uma comparação que vos possa re­baixar, e a vos considerardes, ao contrário, tão acima dos vossos irmãos, quer em espírito, quer em posição social, quer mesmo em vantagens pessoais, que o menor paralelo vos irrita e aborrece. E o que acontece, então? Entregai-vos à cólera.”

(Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo IX)

Esta passagem do livro de Kardec, remete-me para o tema da palestra de hoje:

- Quem de nós nunca sentiu orgulho ou humildade?
            - Afinal o que significam estes sentimentos?
            - Em que medida contribuem estes para a nossa evolução espiritual?

Nas bem-aventuranças, encontramos:

“Bem-aventurados os pobres em espírito, pois deles é o reino do céu” (Mateus, 3)

O nosso desenvolvimento como seres espirituais ao longo do tempo, leva-nos à experimentação de vasto conjunto de emoções, sensações e experiências mais ou menos felizes, mais ou menos meritórias. Bem sabemos que grande parte do que acontece nas nossas vidas vem da nossa própria vontade, seja esta previamente definida no elemento espiritual com base no que deve de ser o nosso caminho de evolução moral, seja no elemento da matéria, fruto do nosso livre arbítrio e da nossa inteligência e conhecimento adquirido. E como bem sabemos, é neste elemento (material) que avançamos ou estagnamos no desenvolvimento.

É aqui que mais experienciamos os sentimentos terrenos, sejam estes mais ou menos elevados, e é também aqui, que as nossas interacções com os nossos “irmãos”, possuem maior repercussão na formação da nossa personalidade e construção do nosso Ser espiritual.
Somos o que somos e fruto do que fomos, mas podemos sempre ser diferentes do que somos. Para isso é preciso desejar aceitar a mudança.  Ainda que a estrutura da nossa personalidade seja ampla e complexa, centro agora a atenção em dois sentimentos particulares: o Orgulho e a Humildade.          

Na nossa vida, talvez diariamente somos confrontados com diversos tipos de sentimentos, expostos sob diferentes formas mediante diferentes contextos e situações. Sempre criadas por nós mesmos.

O orgulho é um sentimento de dignidade pessoal, que pode ser elevado ou exagerado na apreciação feita a si mesmo. Quando nos sentimos felizes por um acto valoroso, enche-se-nos o espírito de orgulho, mas até que ponto se deve de valorizar o nosso orgulho, seja este manifestado num contexto de bem ou de mal?

Somos confrontados com todo o tipo de bens materiais à nossa disposição, somos bafejados com a criação de necessidades que não temos. Vivemos em sociedades materialistas (grande maioria dos casos), onde basicamente a nossa vida é colocada num ponto onde prevalece a vontade de AQUISIÇÃO, de SER, ou melhor, de PARECER.  

O orgulho fere-nos a Alma, sobretudo quando um Ego frágil se deixa dominar por sentimentos de inferioridade, de baixa auto-estima, de falta de confiança, de falta de fé levando a que o orgulho ganhe terreno sobre o que deveríamos de ser e fazer com base no Amor.
Por vezes não são necessárias grandes manifestações de orgulho para nos ferirem o Ego, simples palavras ou ausência de amor nos ferem com grande violência. Por muito que queiramos despojar-nos de orgulho, é difícil. Pois vive como que colado na nossa pele e quando menos esperamos somos feridos por ele, ou ferimos os outros. Agimos cegos na direcção da perda moral e da real substancia espiritual.

O espírito, a única bagagem que transporta é a que carrega o seu coração. O AMOR. E o orgulho afasta-o de nós.
A matéria traz-nos o sentimento do orgulho, na sua versão negativa, na minha opinião. Enche-nos de orgulho o POSSUIR, o MOSTRAR, e até o HUMILHAR os outros (porque prevalecemos sobre o mais fraco), …no fundo alimentamo-nos dos prazeres materiais, que fugazes na sua existência tanta importância lhes atribuímos.

Um amigo disse-me um dia: “Vive espiritualmente na matéria”

O evangelho traz-nos muitas mensagens de ajuda para enfrentar com fé e força essa missão. Sem dúvida coloca à nossa disposição os meios de nos melhorarmos para evoluirmos no sentido da perfeição espiritual.  Jesus, nosso Mestre, apela à humildade, dela fazendo o passaporte para o reino do céu (relembro a citação do evangelho). Mas quantas vezes nos rendemos ao sentimento da humildade?
Não é fácil, isso vos digo…a humildade possui um preço demasiado elevado para muitos de nós. É incómodo. Traz-nos sentimentos de inferioridade. Fere o Ego.
Atrevo-me a dizer que para muitos, a interpretação de humilde é a de quem pouco possui, alguém mal vestido ou até o simples ingénuo. Mas nada disto é humildade, a humildade que todos precisamos de conquistar. Jesus deixou muito claro o alcance da necessidade de sermos humildes, pois Ele nos disse que se não formos humildes como as crianças, não alcançaremos o reino da verdade. 

Deus não teria permitido à inteligência do homem criar tantos e tão bons meios matérias para nossa satisfação pessoal, se não fosse para uso fruto. Não é destituirmo-nos e despojarmo-nos dos bens materiais que nos tornamos humildes ou menos orgulhosos. Os bens materiais não estão na relação directa com a humildade ou a falta dela.
Aos olhos de Deus somos todos iguais, somos seus filhos. As nossas imperfeições afastam-nos do Pai, o orgulho afasta-nos tanto de Deus como dos nossos irmãos. É isso que necessita de mudança…

O mundo precisa de novos valores, valores de Amor onde o orgulho não encontra lugar.

Valorizamos e acreditamos a evolução da Alma num contexto de Amor. Acreditamos no fim último do aperfeiçoamento da Alma. Desejamos aproximar-mo-nos de Deus.

Se o caminho é longo e penoso, mas é possível fazê-lo acolhendo nos nossos corações sentimentos de Amor que tanta felicidade nos traz no momento presente, como trará no futuro desconhecido.

Termino com uma simples frase: O orgulho destrói o que a humildade constrói.

Obrigado

Jan 2012