Olho para vós, …e vejo pequenos agreiros nos vossos
olhos. Olho para mim e vejo que tenho uma trave nos meus.
Serve-me este intróito, à luz do que consta no
evangelho de Mateus, para uma simples reflexão sobre um aspecto simples e
simultaneamente complicado para o ser humano: A noção da consciência.
É fundamental estar ciente do nosso estado de
consciência, para um maior entendimento sobre o que retarda ou adianta a nossa evolução
espiritual. Pois a consciência é a noção das realidades internas e externas ao
nosso ser.
É o estado objectivo de consciência que nos
diferencia uns dos outros. De todos os seres vivos no planeta. Poderei estar
errado, mas penso que só o Homem é dotado de consciência, ainda que este nem
sempre a ouça convenientemente.
Esta mesma consciência que nos permite diferenciar o
bem do mal, em todo o espectro da nossa vivência comum.
Já Sócrates e Platão referiam que o homem deveria de
viver e agir de acordo com a sua consciência, num contexto abrangente às leis
que nos regem, sejam Físicas, Legais, Naturais ou Morais.
E é sobre um aspecto dentro da Lei Moral que desejo
falar-vos.
“O orgulho vos induz a julgardes mais do que
sois, a não aceitar uma comparação que vos possa rebaixar, e a vos
considerardes, ao contrário, tão acima dos vossos irmãos, quer em espírito,
quer em posição social, quer mesmo em vantagens pessoais, que o menor paralelo
vos irrita e aborrece. E o que acontece, então? Entregai-vos à cólera.”
(Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Capítulo IX)
Esta passagem do livro de
Kardec, remete-me para o tema da palestra de hoje:
- Quem de nós nunca sentiu orgulho ou humildade?
- Afinal o que significam estes sentimentos?
- Em que medida contribuem estes
para a nossa evolução espiritual?
Nas
bem-aventuranças, encontramos:
“Bem-aventurados os
pobres em espírito, pois deles é o reino do céu” (Mateus, 3)
O nosso desenvolvimento como seres espirituais ao longo do tempo, leva-nos
à experimentação de vasto conjunto de emoções, sensações e experiências mais ou
menos felizes, mais ou menos meritórias. Bem sabemos que grande parte do que
acontece nas nossas vidas vem da nossa própria vontade, seja esta previamente
definida no elemento espiritual com base no que deve de ser o nosso caminho de
evolução moral, seja no elemento da matéria, fruto do nosso livre arbítrio e da
nossa inteligência e conhecimento adquirido. E como bem sabemos, é neste
elemento (material) que avançamos ou estagnamos no desenvolvimento.
É aqui que mais experienciamos os sentimentos terrenos, sejam estes mais
ou menos elevados, e é também aqui, que as nossas interacções com os nossos
“irmãos”, possuem maior repercussão na formação da nossa personalidade e
construção do nosso Ser espiritual.
Somos o que somos e fruto do que fomos, mas podemos sempre ser
diferentes do que somos. Para isso é preciso desejar aceitar a mudança. Ainda que a estrutura da nossa personalidade seja ampla e
complexa, centro agora a atenção em dois sentimentos particulares: o Orgulho e
a Humildade.
Na nossa vida, talvez diariamente somos confrontados com diversos tipos
de sentimentos, expostos sob diferentes formas mediante diferentes contextos e
situações. Sempre criadas por nós mesmos.
O orgulho é um sentimento de dignidade pessoal, que pode ser elevado ou
exagerado na apreciação feita a si mesmo. Quando nos sentimos felizes por um
acto valoroso, enche-se-nos o espírito de orgulho, mas até que ponto se deve de
valorizar o nosso orgulho, seja este manifestado num contexto de bem ou de mal?
Somos confrontados com todo o tipo de bens materiais à nossa disposição,
somos bafejados com a criação de necessidades que não temos. Vivemos em
sociedades materialistas (grande maioria dos casos), onde basicamente a nossa
vida é colocada num ponto onde prevalece a vontade de AQUISIÇÃO, de SER, ou
melhor, de PARECER.
O orgulho fere-nos a Alma, sobretudo quando um Ego frágil se deixa
dominar por sentimentos de inferioridade, de baixa auto-estima, de falta de
confiança, de falta de fé levando a que o orgulho ganhe terreno sobre o que
deveríamos de ser e fazer com base no Amor.
Por vezes não são necessárias grandes manifestações de orgulho para nos
ferirem o Ego, simples palavras ou ausência de amor nos ferem com grande
violência. Por muito que queiramos despojar-nos de orgulho, é difícil. Pois vive
como que colado na nossa pele e quando menos esperamos somos feridos por ele,
ou ferimos os outros. Agimos cegos na direcção da perda moral e da real
substancia espiritual.
O espírito, a única bagagem que transporta é a que carrega o seu
coração. O AMOR. E o orgulho
afasta-o de nós.
A matéria traz-nos o sentimento do orgulho, na sua versão negativa, na
minha opinião. Enche-nos de orgulho o POSSUIR,
o MOSTRAR, e até o HUMILHAR os outros (porque prevalecemos
sobre o mais fraco), …no fundo alimentamo-nos dos prazeres materiais, que
fugazes na sua existência tanta importância lhes atribuímos.
Um amigo disse-me um dia: “Vive espiritualmente na matéria”
O evangelho traz-nos muitas mensagens de ajuda para enfrentar com fé e
força essa missão. Sem dúvida coloca à nossa disposição os meios de nos
melhorarmos para evoluirmos no sentido da perfeição espiritual. Jesus, nosso Mestre, apela à humildade, dela fazendo o
passaporte para o reino do céu (relembro a
citação do evangelho). Mas quantas vezes nos rendemos ao sentimento da
humildade?
Não é fácil, isso vos digo…a humildade possui um preço demasiado elevado
para muitos de nós. É incómodo. Traz-nos sentimentos de inferioridade. Fere o
Ego.
Atrevo-me a dizer que para muitos, a interpretação de humilde é a de
quem pouco possui, alguém mal vestido ou até o simples ingénuo. Mas nada disto
é humildade, a humildade que todos precisamos de conquistar. Jesus deixou muito claro o alcance da necessidade de sermos humildes,
pois Ele nos disse que se não formos humildes como as crianças, não
alcançaremos o reino da verdade.
Deus não teria
permitido à inteligência do homem criar tantos e tão bons meios matérias para
nossa satisfação pessoal, se não fosse para uso fruto. Não é destituirmo-nos e
despojarmo-nos dos bens materiais que nos tornamos humildes ou menos
orgulhosos. Os bens materiais não estão na relação directa com a humildade ou a
falta dela.
Aos olhos de Deus somos todos iguais, somos seus filhos. As nossas
imperfeições afastam-nos do Pai, o orgulho afasta-nos tanto de Deus como dos
nossos irmãos. É isso que necessita de mudança…
O mundo precisa de novos valores, valores de Amor onde o orgulho não
encontra lugar.
Valorizamos e acreditamos a evolução da Alma
num contexto de Amor. Acreditamos no fim último do aperfeiçoamento da Alma. Desejamos aproximar-mo-nos de Deus.
Se o caminho é longo e penoso, mas é possível fazê-lo acolhendo nos nossos
corações sentimentos de Amor que tanta felicidade nos traz no momento presente,
como trará no futuro desconhecido.
Termino com uma simples frase: O orgulho destrói o que a humildade
constrói.
Obrigado
Jan 2012