sábado, 15 de junho de 2013

O Sofrimento

Passeava-me um dia num jardim, numa tarde de verão. O calor apertava mas não me cansava de admirar a beleza da natureza que me rodeava, a relva verdejante, as plantas com flor que davam um belo colorido aos canteiros, as árvores de grande e pequeno porte que me proporcionavam sombra para me resguardar de um sol lindíssimo que brilhava no céu azul. O dia era de descanso. Sentia-me em paz, comigo e com o mundo.
A certa altura, deparo-me com um sujeito sentado num banco de jardim. Não fosse o seu semblante carregado e não me deteria ali, pois o mais natural era ver as pessoas passearem ou descansarem nos bancos de jardim. Mas aquele sujeito prendeu a minha atenção, pois o seu olhar estava vazio e as suas feições transbordavam sentimentos de profunda tristeza.
Aproximei-me e sentei-me a seu lado. Nem para mim olhou ou manifestou qualquer tipo de expressão. Só o corpo dele ali estava, a sua mente vagueava sabe-se lá onde. Passado um pouco, olhou para mim mantendo o silêncio. Vi lágrimas nos seus olhos.
Coloquei uma mão no seu ombro, e disse-lhe: Qual a razão do teu sofrimento, meu irmão?

Sofrimento. Palavra que muito ouvimos e conhecemos, que reúne e se traduz em tão diversos e dolorosos momentos nas nossas vidas. O sofrimento, será o tema da palestra de hoje.

Falar de sofrimento, não é fácil, pois muitas vezes confunde-se a dor com o sofrimento, quando na verdade uma é consequência da outra, mas o sofrimento por si só não precisa de nascer de uma dor.
Convenhamos que a dor é física, é maleita do corpo. O sofrimento é mais profundo, pois vem da alma.

E muitas vezes ouvi dizer que as dores da Alma são bem piores que as do corpo.

Agora digam-me:

Alguém aqui já passou por um momento de sofrimento na sua vida?
E saberão quais foram as causas desse sofrimento (não falo de dores)?
            Acham que foi castigo divino ou foi por culpa própria?

Vamos tentar encontrar respostas para estas questões…

Jesus disse-nos um dia, através da seguinte mensagem que encontramos no evangelho de S. Mateus:

“Vinde a mim, todos vós que estais aflitos e sobrecarregados, que eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei comigo que sou brando e humilde de coração e achareis repouso para vossas almas, pois é suave o meu jugo e leve o meu fardo.“

Esta mensagem que Jesus nos transmite, carrega em si mesma, boa parte das razões associadas ao nosso sofrimento. Sejam a brandura e a humildade, como nela são referidas, condições essenciais ao Homem para que este não sofra.
A sobrecarga e as aflições que Jesus fala, não são mais do que os fardos que vamos acumulando ao longo da nossa caminhada de vida, carregando a nossa alma com orgulhos, vaidades, egoísmos, etc...
Jesus não nos condena, somente nos diz que estamos errados em seguir por essas vias e que se nos encontramos num estado de infelicidade é por culpa nossa e que olhemos para Ele, pois o seu jugo e fardo são muito leves.

Creio que não será difícil de entender que as únicas razões que estão na base do nosso sofrimento, são as nossas imperfeições morais

Não vale a pena procurar mais longe, nem tentar articular uma qualquer teoria mais ou menos elaborada e complexa para explicar os porquês do nosso sofrimento: Sofremos por culpa própria.

Sofremos, porque somos seres que facilmente se entregam às paixões mundanas da vida, porque somos egoístas e orgulhosos, porque somos mais vaidosos com o TER do que com o SER, porque achamos que o amanhã não existe e por isso temos de viver tudo hoje, porque não aceitamos ser humildes de coração e queremos ser muitas vezes o centro das atenções, os maiores, os valentes. Sofremos muito pela falta de amor-próprio e amor ao próximo, sofremos porque não somos caridosos e depois muitos outros não o são connosco quando um dia precisamos deles, sofremos pela nossa falta de fé no futuro.

Somos imperfeitos, é verdade. Temos muitos defeitos a corrigir. E quando pensamos um pouco naquilo que verdadeiramente somos, não por fora, mas sim por dentro, tanto para nós próprios como para os outros, muitas vezes o dedo acusador da nossa consciência, arrebata-nos com uma força muito grande, mostrando-nos que não caminhamos nos trilhos certos da vida.
Mas importa entender que nós não sofremos porque somos maus. Sofremos porque somos ignorantes… Porque aqueles a quem achamos de maus, não o são na verdade, são somente seres ainda muito ignorantes.

Mas em verdade vos digo, que o sofrimento não é opção nas nossas vidas. Faz parte integrante delas e dificilmente (pelo menos para já) iremos conseguir livrar-nos de sofrer.

E porque vos digo isto?

A resposta é muito fácil. Somos seres muito impuros ainda e por isso, só conseguimos aprender as nossas lições pelo lado menos bom, isto é, pela dor e pelo sofrimento.
Lembremo-nos que estamos encarnados para aprender, para evoluir moral e intelectualmente, não andamos aqui para ter mais 10 carros, 5 casas, 20 kg de ouro e joias, 3 aviões e 1 uma ilha paradisíaca, ou qualquer que seja o bem material que exista. Estamos aqui para crescer e evoluir em valores morais. Estamos aqui para crescer no Amor.
E um dos grandes problemas que contribui para o nosso atraso evolutivo é este mesmo.

Vou contar-vos agora uma história bíblica muito profunda:

“Havia na terra de Huz, um homem muito rico chamado Job, que era irrepreensível, um homem de bem, que temia Deus e evitava tanto quanto possível o mal. Tinha 7 filhos e 3 filhas, 7.000 ovelhas, 3.000 camelos, 500 juntas de novilhas entre muitas outras coisas. Mais eis que um dia desbaba sobre esse homem uma catástrofe. Perdera tudo o que possuía, morreram-lhe os filhos e filhas, ficou coberto de lepra da cabeça aos pés. Ficou apenas com a sua mulher insensata e sem caridade.
Então de milionário, ficou reduzido a mendigo. Sentou-se sobre um monte de lixo e raspava as suas feridas com restos de um vaso que fora uma relíquia. No meio da sua dor, disse:

            “ Nu sai do seio da minha mãe
              Nu voltarei ao seio da terra
              O senhor me deu
              O senhor me tirou
              Bendito seja o nome do senhor”

A atitude de Job diante daquela tragédia que se abatera na sua vida, mostra a grandeza, elevação e evolução do seu espírito. Compreendeu, sem revolta, o porquê do seu sofrimento e assim soube sofrer com resignação, com calma, paciência e sobretudo, não desesperou.

A vida, manifesta-se-nos diariamente com base em duas leis divinas primordiais, que são a Lei do Amor e a Lei da Causa-Efeito, entre outras obviamente, mas estas possuem grande importância. E estas duas, afectam o nosso dia-a-dia de uma forma que dificilmente conseguímos entender completamente.
Com isto vos quero dizer, que quando se sentirem sofredores, não procurem primeiro as causas externas desse sofrimento. Procurem primeiro dentro de vós mesmos, pois as respostas estão lá guardadas e prontas a serem-vos dadas logo que a vossa consciência desperte para elas.

Tudo está dentro de cada um de nós. Deus deu-nos o privilégio de sermos seres únicos que caminham por sua própria vontade e podem construir o seu amanhã da forma como o quiserem viver.
Deveríamos de dar graças ao livre arbítrio que Deus nos concede, pois é através desse mesmo livre arbítrio que podemos sofrer menos hoje e amanhã.

E como faço isso, é a grande questão? Como posso deixar de sofrer?

Pois bem, essa parte é muito fácil dizer-vos. Durante a palestra até já o fiz. Mas a grande e invariável verdade, é que é muito difícil para nós deixarmos de sofrer hoje. Estamos condenados a isso, fruto de sermos da forma como somos.
Seja pelos erros do passado, antes desta existência, como pelos erros desta mesma existência, a limpeza do nosso coração precisa ainda de muito trabalho, de muitas horas e experiências para se limpar definitivamente.

Quando muitas vezes aqui se fala de Amor, Caridade e Humildade, só para dar alguns exemplos, nunca pensaram que a felicidade das nossas vidas só está alicerçada nestes pilares? Que tudo o resto é efémero, passageiro e sem importância?

São tantas coisas conscientemente ou inconscientemente que fazemos aos outros e contra nós que nem sempre é fácil entender a razão do nosso sofrimento. Mas estamos aqui para aprender e se conseguirmos realmente assimilar as lições a que nos destinámos aprender, seremos todos os dias um pouquinho mais felizes e menos sofredores.

Jesus disse-nos:  "Bem-aventurados os aflitos, pois que serão consolados."
Mas, como há de alguém sentir-se ditoso por sofrer, se não sabe por que sofre?

O sofrimento é um bálsamo para a nossa evolução moral.
Não chega eu saber o que é e para que serve esta ou aquela ferramenta se não a souber usar, por exemplo. Para saber o que é o amor, preciso de saber o que é o ódio. Para saber o que é a fome, preciso de saber o que é a abundância. Precisamos de passar pelas experiências para aprender…. e são essas passagens que nos fazem sofrer muito, pois não conseguimos entender a sua génese.
Por muito que nos custe acreditar e aceitar, precisamos nesta fase da nossa evolução, de sofrer. Não que o queiramos ou gostemos disso, muito pelo contrário, mas sem o sofrimento devido, não conseguimos aprender.

Somente o Homem com uma consciência mais elevada consegue aprender com os seus erros, aceitando com calma, resignação e paciência as consequências dos mesmos. Esse Homem, será sempre muito menos sofredor e sobretudo, caminhará muito mais rapidamente na direção de Deus.

Tenhamos fé e esperança, pois um dia deixaremos de sofrer, porque já não precisaremos de passar pelas lições da vida terrena.

Termino com uma frase de Allan Kardec, que exprime muito bem a mensagem que vos desejei transmitir hoje:


“O homem é assim o árbitro constante de sua própria sorte. Ele pode aliviar o seu suplício ou prolongá-lo indefinidamente. Sua felicidade ou sua desgraça dependem da sua vontade de fazer o bem.”