quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

As expectativas

Recordemos as bases da Doutrina Cristã:

Religião Cristã -> Filosofia (Estudo do Pensamento) -> Ciência (Razão & Lógica)

Hoje, vou falar-vos um pouco sobre a ligação da Psicologia à Espiritualidade.

A nossa existência, como bem sabemos, divide-se em dois planos: o material e o espiritual. E quer estejamos num ou no outro, somos sempre seres sociais e comunitários, isto é, somos confrontados em permanência a viver interligados a outros seres, fundamentalmente em comunidade.

Aqui podemos ressalvar os eremitas, aqueles que decidem isolar-se do mundo e viverem as suas vidas no completo isolamento social. No entanto, nunca estamos realmente sozinhos.

Todos os seres vivos, ou praticamente todos, vivem em sociedades mais ou menos organizadas, com um maior ou menor grau de afinidade. Mas no fundo todos obedecemos a leis muito básicas, como por exemplo a lei da sobrevivência. Tentamos ser mais fortes e ir sempre um pouco mais além na vida.

Na natureza, as relações estabelecem-se maioritariamente entre:

Gregarismo Absoluto: estabelecem-se em grupos ou sociedades mais ou menos organizadas, temporárias ou permanente, visando a sua proteção.
Um exemplo deste tipo de relações são as formigas.

Individualismo: não é mais do que a afirmação do indivíduo perante um grupo ou sociedade. Um exemplo são os gatos-bravos.

Gregarismo Relativo: estabelecem-se em bandos, mas não se estruturam em sociedades, existe uma definição de estatutos predominantes. Um exemplo é o estorninho, que no inverno andam bandos e no verão formam-se casais.

Parasitismo: são parasitas. Os piolhos são exemplos disso.

Comensalismo e Simbiose: são relações que se estabelecem com benefícios para ambos. As rémoras e os tubarões são um bom exemplo.

E em tudo na natureza, mesmo parecendo o contrário por vezes, existe uma organização bem definida e hierarquizada, tal como nas nossas sociedades modernas.

Relembro que somos iguais no plano espiritual ao que somos no plano material, a morte não nos altera em nada a nossa condição moral e intelectual.

Sempre existiu, seja no reino animal, vegetal ou humano, uma quase “guerra “ relativa à predominância de poder territorial, seja para alimentação ou para definição de poder económico ou status social, no nosso caso.
No estabelecimento das nossas relações, enquanto seres humanos, existe algo que nos divide em permanência que é, na maioria das vezes, o catalisador de muitos e muitos problemas que enfrentamos e nos vamos deparando ao longo das nossas vidas.

E refiro-me concretamente às expectativas.

Passo a explicar:

Tomemos dois indivíduos. O seu relacionamento, está em permanência baseado nas expectativas que um tem sobre o outro e vice-versa. Isto é, o que cada um pensa ou deseja receber em troca do outro, seja qual for o tipo de interesse.

Nenhum relacionamento, por muito casual que seja, é inócuo, isto é, não serve para nada. Temos sempre algo a aprender e a reter, por muito pouco que seja.
A questão é estarmos atento para perceber o que é que se pode aprender daquele relacionamento. 

Vivemos a nossa vida com base nas expectativas que projectamos a todo o momento. Nas esperanças que desejamos que os outros cumpram.

Nos desejos materiais (de ter isto ou aquilo), de vir a exercer esta ou aquela profissão, de viajar muito, de ter mais ou menos filhos, de sermos promovidos, de comprar uma moradia ou uma casa de férias, de ser melhor pessoa e mais caridoso, etc… etc…

Estamos permanentemente a gerir expectativas, tanto as nossas, como as que projectamos nos outros relativamente a nós.

Depois, quando nos relacionamos com alguém, entramos num mundo nem sempre fácil de compreender, pois somos todos seres diferentes. E essas diferenças advêm de inúmeros fatores internos e externos, sempre baseados na aprendizagem de vida de cada um.

As sociedades, mais ou menos modernas, tentam construir modelos de vida para definir os caminhos de evolução de cada um.

Dou um pequeno exemplo muito básico:

Nascemos, estudamos, trabalhamos, casamos, compramos casa e carro, temos filhos, reformamo-nos e morremos. Isto é o retrato de uma grande maioria de pessoas e casais.
Mas na natureza existem muitos outros modelos diferentes de modos de vida.

As expectativas, sejam as nossas pessoais sejam aquelas que temos dos outros, são em muito o motor ou da nossa felicidade, ou da nossa tristeza e degradação interior.
Apegamo-nos às coisas ou às pessoas e muitas vezes desejamos bem mais do que elas realmente nos podem oferecer. Imaginamos que as coisas nos trazem felicidade, ou pelo menos acreditamos muitas vezes nisso. A verdade, como bem sabemos, não é essa. Muito pelo contrário.

Normalmente, o ser humano exige mais dos outros do que de si mesmo. Impõe expectativas sobre os outros que não sabe se os outros são capazes de as preencher ou sequer se tal fazem parte da sua vontade relativamente a nós.

É como ter a expectativa que Deus nos vai intuir os números do euromilhões. Quando nos apercebemos que nos fartamos de jogar e o prémio nunca mais nos sai, ficamos tristes, desolados, frustrados. Mas será que Deus é o culpado disso?
Nós é que criámos expectativas em que Ele nos iria “dar” o euromilhões. Mas quem nos disse que seria assim? Porque é que teria de ser assim?

Outro exemplo é o caso dos casais, em que o marido ou a esposa criam demasiadas expectativas sobre o outro e depois nenhuma delas são concretizadas. Cai-se no desencanto e a tempo, no divórcio.

As relações humanas não são fáceis por natureza, tudo porque cada um rema para o seu lado. Exigimos muito dos outros. Criamos e depositamos as nossas expectativas nos outros sem. Queremos permanentemente ter domínio sobre as coisas e os outros.

Um dado muito importante a reter e compreender, é o facto da nossa felicidade estar directamente ligada à gestão que fazemos das nossas expectativas, isto é, daquilo que desejamos e esperamos, de nós, da vida e dos outros.

O que melhora ou piora a nossa felicidade, está na ligação que fazemos aos defeitos de carácter já muito conhecidos por nós, tais como: orgulho, egoísmo, vaidade, maledicência, etc…

A chave da nossa felicidade está no autoconhecimento. Na nossa capacidade de nos libertarmos dos nossos filtros e condicionalismos sobre os outros e deixarmos que cada um seja o que é e que aprendamos a nos conhecermos a nós mesmos.

Eu só posso conduzir um carro depois de aprender o código (as regras) e aprender os processos de condução.

Da mesma forma, eu só posso viver e ser mais feliz, se aprender a conhecer-me a mim próprio e consequentemente os outros.

Conhecendo-me melhor, posso melhorar e definir melhor os meus relacionamentos, gerindo melhor as expectativas e envolver o meu dia-a-dia com mais paz interior e consequentemente, maior felicidade.

Na esfera espiritual as coisas acontecem da mesma forma que acontecem no plano material.

As obsessões são muitas vezes fruto de expectativas demasiado elevadas sobre os outros e acontecem também porque os outros não corresponderam a essas expectativas e os obsessores sentem-se desiludidos, prejudicados e defraudados. Por isso procuram vingança.

Os egoístas nunca fazem nada sem a expectativa de uma moeda de troca.

Os orgulhosos nunca esperam mais do que serem valorizados e reconhecidos acima de tudo, mesmo quando nada está em jogo e não merecem nenhum reconhecimento.

Os vaidosos, não esperam mais do que serem bajulados e “engraxados” como costumamos dizer em linguagem mais comum.

Os maledicentes não querem mais do que contribuírem para a confusão e contínua prática do uso da má fé.

Os arrogantes só desejam sentirem-se sempre acima dos outros.

Estes são alguns pequenos exemplos do que perante o que cada um é, segundo as suas expectativas pode ser muito, mas mesmo muito infeliz. Desta forma, tornar a vida dos outros também menos feliz.

É recomendável termos consciência das expectativas que temos para a nossa vida, também das expectativas que depositamos nos outros.

Termino com uma frase de Mário Quintana, que foi um poeta brasileiro que expressa muito bem a nossa relação com as expectativas:

“ As pessoas não estão neste mundo para satisfazer as nossas expectativas, assim como não estamos aqui, para satisfazer as delas”.

Isto para mim é uma grande verdade. Cada um tem de trabalhar pelo seu próprio bem e não esperar mais do que a felicidade do seu melhoramento.


Obrigado,